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De frente... pro crime!

                Rosa Pena

 
E lá se foi o Réveillon com seu cheiro de despedida, seu olhar nostálgico, sua paranóia em roupas brancas, brilhos,  tentativa de fingir felicidade soltando fogos de artifício. Ele não admite ser um dia qualquer do calendário. É um feriado metido a ser o mais legal de todos. Coitado! Não sabe que bom é o Dia de Finados. Geralmente chove (chuva fina) dai a gente pode viajar sem engarrafamentos,  permanecer em casa, pegar um cineminha num shopping (estão vazios) ficar com cara de bunda, pois quem vai cobrar sorrisos no dia dos defuntos?
Pensa bem, pois você será um amanhã.

A probabilidade de se passar uma virada de ano excelente é mínima. Baixa uma ansiedade cabalística, com tarô, tarados, pai de santo de tudo quanto é canto exorcizando o ano anterior e o novo também, mesmo que o antigo tenha sido show. Profetas articulam desgraças óbvias, o trânsito e o décimo terceiro confirmam o caos. O sentimento de culpa pela barriga tender adquirida no Natal demonstra que a dor no ciático, contraída na esteira, foi inútil.

Você que se achava sensata e passava embaixo de escada, não teve coragem de entrar o novo ano com um pretinho básico. “Desconjuro pé de pato, mangalô três vezes”.
 Tudo que nesta data acontece é dimensionado com a devida paranóia que o momento exige. Se seu parceiro deixou de lhe dar um beijo meia-noite: Fodeu! Sinal de que será um ano escasso em sexo. Quem disse? Papacurasteiro (o babalorixá das globais).
 
O Réveillon tem que ser ensaiado previamente. Comece agora, assim terá esse novo ano inteirinho para decorar. Vamos lá: Nada de demonstrar nervoso (toma um tarja),vestidinho branco, o espumante bem gelado, uvas verdes, calcinha vermelha, cara constante de ternura e deixa para odiar sua amiga, que fechou o ano com promoção e você ficou chupando o dedo (até para chupar tem que se saber o lugar) para depois. Pense que ela merece por ter sido um modelo (ainda que nu) de funcionária, mas que a vida dá muita volta. Dá sim, lógico que dá, assim como ela deu pro chefe. Não esquente com vinganças imediatas, pois esse é um prato que se come frio. Lá pro dia de reis comece a pensar na folia. Sugestão: Bota o corvo de Poe repetindo "Nevermore" quando ela ligar e pedir grana.

Esqueça a histeria, ainda que o celular de seu amado não pare de tocar e você se sinta uma rena. Faz parte desse cenário de final de ano.

Decorou tudo para o final de 2011? (depois de velha o tempo passa rapidinho). Não esqueça que os próximos trezentos e sessenta e quatro dias dependerão da cor de sua aura na passagem. O Rei usa sempre azul para refletir nela o azul. Veja que sua agenda foi trocada e tudo recomeçou com você um ano mais velha e cinco quilos mais gorda. Culpa de quem? Do Peru? Do lombinho? Não! Da Auralice que deixou você vermelha de raiva com a virose que levou dez quilos da schifosa.

 Agora (calminha que já passaram as festas), você já pode ficar puta com essa orgia gastronômica que trouxe a pochete de banha embaixo do umbigo. Ah! Bem no começo de suas férias. Vai pra Bahia? Dança axé até perdê-la ou se perca no Pelourinho. Ó Pai ó!

Existe, porém, um consolo (não do "SexShop"), mas sim alívio. Tem muita gente como nós. Que sabe que tudo continua como tinha que ser com ou sem essa mexida no calendário. A festança é só para dar mais frisson na mesmice, mais dinheiro pro comércio e engordar o gado (não lhe chamei de vaca não, entendeu porque quis).
 
De resto paz e luz dia 11 de janeiro, se preferir de fevereiro, março...Escolha a data ou tente ser feliz sem data certa e sem virada. De frente... pro crime!

 
 
 
 
 
midi: De frente pro crime
Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 11/01/2011
Alterado em 10/04/2011
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